REPRESENTATIVIDADE

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Governadores 'saem do armário' em ato inédito, enquanto a militância comemora de forma seletiva.

Por CARLOS SANTANA 03/07/2021 - 20:30 hs
REPRESENTATIVIDADE
Fatima Bezerra e Eduardo Leite. A esquerda e a direita da diversidade.

 Primeiro foi Eduardo Leite (PSDB-RS), governador eleito sob a hoste do bolsonarismo em 2018 e atualmente rompido com o Governo Federal, que ao declarar em entrevista para o Conversa com Bial (TV Globo) na madrugada da última quinta-feira (01) assumiu a sua homossexualidade. 


 Entretanto, a forma que ele trouxe essa afirmação parece não ter animado muito a militância "Eu sou gay. E sou um governador gay, e não um gay governador, tanto como Obama nos Estados Unidos não foi um negro presidente, foi um presidente negro. E tenho orgulho disso". Ao que parece, embora tenha revelado estar namorando um médico capixaba, o político de formação conservadora não há de seguir pela linha 'identitária' e portanto, deve colocar seus feitos como gestor à frente da sua orientação sexual. 


 Diversos políticos de imediato saíram para parabenizar o tucano pela atitude. João Dória (PSDB-SP) disse que admira Eduardo Leite e Luciano Huck publicou ter orgulho de seu amigo. O movimento foi visto como um aceno à terceira via nas eleições presidenciais do ano que vem, que atualmente estão polarizadas entre Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (sem partido).


 E isso parece não ter agradado quem se apossou do monopólio da virtude sexual ideológica que age de forma seletiva quanto àqueles considerados iguais e dignos de empatia. 


 Vejamos pelo exemplo do ativista Jean Willys (PSOL) que ao responder uma postagem que considerava a atitude de Leite um ato a ser louvado, foi a única personalidade política de grande expressividade a atacá-lo. Willys escreveu: "Louvado é um pouco demais. Acho bacana. Aplaudo. Mas miro a notícia com muita crítica e olhar de quem conhece as artimanhas das bichas de direita que optam por sair do armário em certos contextos". 


 Sem esse tipo de crítica, a governadora Fátima Bezerra (PT-RN) também assumiu a homossexualidade no dia seguinte ao gaúcho. A declaração veio pelo Twitter onde escreveu "Na minha vida pública ou privada nunca existiram armários. Sempre demarquei minhas posições através da minha atuação política, sem jamais me omitir na luta contra o machismo, o racismo, a LGBTfobia e qualquer outro tipo de opressão e de violência." e elogiou o colega dizendo que fez um gesto importante, além de prestar-lhe solidariedade "Eu sei o que é a dor da discriminação e do preconceito". 


  No caso da petista, é claro que além das críticas infelizmente já esperadas, não se teve nenhum tipo de agressão verbal dentro da classe política. Ainda bem. 


 Embora até mesmo os políticos lamentam que ainda tenhamos de celebrar o que seria uma "não questão", há de se recordar na história o quanto esse ato de Fátima e Eduardo representa a liberdade de existir enquanto agente público e pessoa LGBTQIA+. 


 Em 1993 Renildo José dos Santos vereador de Coqueiro Seco (AL) após dar entrevista para rádio onde assumiu ser bissexual e afirmar que o prefeito da cidade seria "enrustido", teve durante a madrugada a sua casa invadida por homens fardados. Após três dias do sequestro, o corpo do parlamentar foi encontrado degolago, carbonizado e com evidências de tortura. A cabeça foi achada boiando em um rio na divisa do estado. Ao que se apurou na época, os criminosos teriam, além de toda crueldade, introduzido um pedaço de madeira em Renildo. Mas o caso, embora chocante, não teve grandes investigações ou interesse para punir os envolvidos ao longo do tempo. Somente em 2015 os culpados foram presos.


  A intolerância está incutida pela história do Brasil em diferentes frentes, lados ideológicos e contextos. Só não consegue ver quem não quer ou quem se quer passar pano. Esses sim, não passarão.